Sexta, 22 de Agosto de 2025
A Região Metropolitana do Rio de Janeiro recebe até o fim de agosto a 5ª Mostra de Cinema Árabe Feminino, com exibições no Rio de Janeiro, Duque de Caxias e Niterói. Entre os destaques está a libanesa Rania Stephan, que realizará uma masterclass online sobre o uso de imagens de arquivo, com foco em seu filme Os três desaparecimentos de Soad Hosni.
A mostra começa nesta sexta-feira (22), no Centro Cultural Banco do Brasil do Rio de Janeiro (CCBB-RJ), onde se estende até o dia 30 de agosto. O Cine Arte UFF, em Niterói, recebe a programação entre 25 e 27 de agosto, e a Faculdade de Educação da Baixada Fluminense (FEBF/Uerj), em Duque de Caxias, terá exibições em 28 de agosto.
Entre as novidades, o projeto “Solidariedade Brasil-Árabe” exibirá produções brasileiras e árabes em sessões conjuntas. Entre os pares, os filmes palestinos Slingshot Hip Hop e O Protesto Silencioso: Jerusalém 1929 serão exibidos com os brasileiros Sua Majestade, o Passinho e O Canto das Margaridas.
A curadoria é assinada por Alia Ayman, Analu Bambirra e Carol Almeida, que desde 2019 apresentam um panorama do cinema árabe contemporâneo produzido por mulheres, abordando temas como o genocídio palestino, a resistência cultural e a preservação da memória em contextos de violência.
Filmes inéditos no Brasil compõem a seleção, como Rainhas. Outros destaques incluem A Canção da Besta, Dançando a Palestina e Neo Nahda, que abordam identidade, diáspora e resistência.
Com masterclass marcada para o dia 24 de agosto, Rania Stephan conta que a formação vai abordar sua experiência com imagens de arquivo ao longo de toda a sua carreira, incluindo seu mais novo filme, Os três desaparecimentos de Soad Hosni. Sobre o longa-metragem, ela define:
"É uma versão arrebatadora de uma era rica e versátil da produção cinematográfica egípcia. Soad Hosni, do início dos anos 1960 até os anos 90, personificou a mulher árabe moderna em sua complexidade e paradoxos".
Composto exclusivamente por filmagens em VHS de filmes egípcios estrelados por Soad Hosni, o filme é construído como uma tragédia em três atos, em que a atriz conta a história de sua vida, sonhada na primeira pessoa do singular.
Nascida no Cairo em 1943, Soad Hosni cometeu suicídio em Londres em 2001. Entre os 19 e os 49 anos, atuou em 83 longas-metragens, com 37 diretores. Por ter vivido uma trajetória da miséria à riqueza, ela recebeu o apelido de "cinderela do cinema árabe". Soad Hosni era filha, irmã, amiga, noiva, amante e esposa de ilustres estrelas do cinema egípcio quando este era o principal fornecedor de ficção cinematográfica no mundo árabe.
Agência Brasil: O que a levou a se dedicar ao cinema?
Rania Stephan: No início, foi o acaso e a necessidade, mas tudo o que posso dizer hoje é que não consigo me imaginar em outra profissão que não seja de cineasta ou uma artista que trabalha com imagens.
Agência Brasil: Você fez um documentário sobre Gaza. Sua perspectiva como mulher e árabe faz diferença no seu trabalho? Como você deixa essa marca?
Rania Stephan: Meu filme Danos: para Gaza, a terra das laranjas tristes foi um modesto gesto artístico contra a guerra de 2008, liderada por Israel contra Gaza. Israel liderou uma série de guerras violentas na Faixa de Gaza, desde 1967, culminando no genocídio sem precedentes que se vive neste território.
Meu filme tenta encapsular visualmente os danos que a guerra causa aos vivos. É também uma homenagem às plantações tradicionais de frutas cítricas de Gaza, agora perdidas devido às inúmeras guerras e ocupações. Também faz referência ao comovente conto de Ghassan Kanafani, A terra das laranjas tristes, sobre um idoso palestino expulso à força durante a Nakba de 1948.
Agência Brasil: O objetivo da sua masterclass no Brasil é investigar maneiras de lidar com imagens de arquivo. Você trabalhará com seus filmes e os utilizará como exemplo?
Rania Stephan: Nesta masterclass, desenvolvo a maneira como meu trabalho lida com material de arquivo, desde a primeira imagem do meu primeiro filme até hoje, com foco principalmente nos filmes que estão em exibição no Festival Mulheres Brasil.
Agência Brasil: Como você vê o papel das mulheres no cinema e no audiovisual hoje? Qual a importância de um festival de cinema com essa perspectiva feminina e árabe?
Rania Stephan: Para compreender a complexidade do nosso mundo, precisamos ampliar ao máximo a multiplicidade de vozes, pontos de vista, perspectivas, propostas e abordagens artísticas diferentes e mais radicais no cinema e no audiovisual em geral. Caso contrário, seremos reduzidos a versões simplistas, unilaterais, pouco sofisticadas e formatadas do mundo e de suas representações. Nesse sentido, as vozes femininas no cinema são cruciais para expressar uma parte grande e prodigiosa das experiências humanas.
Devo acrescentar que, com a atual decadência política autoritária, reacionária e racista que o mundo está testemunhando, muitas vozes estão sendo marginalizadas, esmagadas ou suprimidas. Portanto, nós, como árabes, mulheres e cineastas, precisamos lutar e encontrar espaços nos quais possamos expressar nossos pontos de vista, contar nossas histórias e ser ouvidas.